Temos um ‘véio da Havan” ‘GLS’ pra chamar de nosso!

Todo mundo leu a entrevista de um dos sócios da San Sebastian para o jornal A Tarde ou somente eu li? Estou perguntando, porque não percebi o burburinho comum entre comunicadores, influenciadores e demais “dores” do meio LGBT¹ ou, como diria Magal, “GLS”.

É isso mesmo, dentre a coletânea de sandices do empresário tem isso aqui: “Agora tem um bocado de sigla. Sei que já tem um T aí no meio, um Y. Acho que GLS engloba tudo. Pô, se é travesti, é gay”. 

Pô, mano! Tá ligado, pácêro?! Minhas irmãs se vocês tinham inveja dos bolsominions por causa do “véio da Havan”, podem ficar felizes pois temos o nosso “véio da SAN” agora.

Vou já adiantando que SIM fiz a cobertura de parte da Micareta Salvador, que celebrou também os 10 anos da San Sebastian, mas não posso ser parcial e deixar de lado as declarações que constam nessa entrevista. 

Mas vamos por tópicos

Deu a loka na San?

Engraçado que durante a Micareta cheguei a comentar com colegas que muito do sucesso da marca, na minha humilde opinião, se devia a sua quase que total ausência quando o assunto é militância. Realmente, olhando de cima do camarote você tinha noção de que mais da metade do público atendia ao “padrão” que a casa vende e estimula, mas em nada dialoga com a realidade do gay soteropolitano. 

Lendo as falas de Magal fica visível que estamos vivendo um momento político muito controverso e que ataca diretamente as principais pautas e até algumas conquistas da frente LGBT. O Brasil de agora tem revelado muito do que se esconde sob as máscaras e ver um empresário gay falar de forma tão irresponsável sobre algumas importantes questões é lamentável. 

Pior é constatar que o poder, a branquitude e a heteronormatividade silenciam até mesmo os mais “ativistas” dessa nossa terrinha de Irmã Dulce, diante da exibição de seus (deles) poderes. Não apenas o governo Bolsonaro esfrega nas nossas caras todo tipo de violência, corrobora com ela e a valida, como o nosso comodismo coloca à prova o que de fato somos capazes de fazer dentro da própria comunidade.

Relacionamentos experimentais

Quando Magal fala desse “padrão”, me vem em mente muito do exibicionismo e a manutenção da solidão do homem gay? Te desafio a listar mentalmente casais formados a partir desse “conceito” que não vivam relacionamentos experimentais, pra não dizer fantasiosos, pouco equiparados e/ou não bem-sucedidos historicamente: trisal, “aberto”, poligâmico, por/em aplicativos, sugar grandfather daddy, ostentação de todo gênero e tantas outras formatações que a gente está cansado de saber que ainda não são capazes de atender o mínimo de nossos anseios emocionais².

Enquanto somos o tempo todo confrontados pela sociedade quanto a “promiscuidade do gay”, o tal “padrão” busca se higienizar nos espaços, nas boates e se heteronormativizar, mas tende a colocar – e se enganar – nesses relacionamentos experimentais como algo aparentemente promissor e “libertário”. No meu ponto de vista, não há nada além da perpetuação de seus narcisismos, voltas em torno dos próprios umbigos e muita publicidade.

Pelo visto, uma fonte infindável de lucros para parte do empresariado local. Não sou nenhum especialista, mas vou lhes avisar que isso não é um casamento, um relacionamento estável ou aquele romance que lá no fundo tanto desejamos. Isso é um arranjo que alimenta exclusivamente essa frágil bolha da padronização e seus dividendos para o comércio gay.

Sou completamente a favor da liberdade, mas não me pautem essas demandas como regras sociais, como um “padrão” a seguir, assim como o tal “padrão SAN” só existe no marketing dos donos, pra turista ver e nas cabecinhas de algumas gays por aqui. É como dizer que na cidade mais negra fora da África, aquela galera que eu vi na Micareta representa a boate San Sebastian que fica aqui no Rio Vermelho. Parem! “81% do público formado por turistas”, segundo assessoria do evento.

San Sebastian o Santo dos Gordos

Para André, o modelo (do abadá) “discrimina menos” e até facilita a vida dos “gordinhos”. “Antigamente, o que o gordinho fazia quando pegava o abadá? Rasgava do lado. Ele era obrigado a reformar. Hoje não. É só deixar aberto, botar uma camisa branca e acabou”. 

Sinceramente?! Eu estou rindo, mas é de nervoso. Colocar tudo no mesmo balaio “GLS” não foi o suficiente, vamos “solucionar” a questão do corpo gordo entre homens gays, com um abadá aberto na frente E UMA CAMISA BRANCA. “Acabou!”.  Alguém já acendeu uma vela pra ele hoje? No que diz respeito a qualidade dos eventos a empresa pode ser nota 10, mas no quesito militância ou “cala a boquinha que é melhor” perde feio na prova. 

“Mas hoje é hype ajudar minorias, entendeu? Quem não tá, tá fora da moda. Isso para a gente chegou num momento muito bacana”, diz André. 

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NÃO ADIANTA QUERER FALAR SÉRIO SOBRE HOMOFOBIA OU O "SER LGBT NO BRASIL" SE TUDO QUE SE FALA NO DIA-DIA SOBRE O ASSUNTO, NA TV, NAS REDES SOCIAIS E NAS SALAS DO SEU ESCRITÓRIO, SE RESUME A ESTEREÓTIPOS, CHACOTA, PALHAÇADA E "HUMOR". . . . SE HOMOFOBIA FOSSE LEVADA NA PONTA DA FACA, PELOS PRÓPRIO LGBTS, COMO O RACISMO É PELOS NEGROS (E LGBTS NEGROS) – SÓ POR UNS POUCOS AMIGOS AQUI NO INSTAGRAM EM NOME DE OXALÁ – CASOS COMO O DO "TIELLO" SERIAM MENOS FREQUENTES. . . . E NÃO PRECISARÍAMOS DE 4 BALAS E UMA MULHER HÉTERO – ASSIM COMO OS NEGROS NÃO PRECISAM DOS BRANCOS – PRA FALAR SÉRIO SOBRE O TEMA QUE NOS AFLIGE HÁ DÉCADAS E PÓS NOVO GOVERNO SÓ TENDE A PIORAR. . . . ENTÃO MENOS MINHAS IRMÃS, BEM MENOS! 👍 #homofobia #tiellomacedo #crime #brasil #instagram

A post shared by Rafael Dos Anjos Oliveira (@rafaeldosanjosoliveira) on Oct 24, 2019 at 1:47pm PDT

Quer dizer, os grandes patrocinadores da marca querem “hypar” com as minorias e depois vocês me vem falar de pink money em suas colunas! Me batam um caminhão de cebolas. “Fora de moda” é precisarmos de uma jornalista hétero branca falar das nossas dores em relação a lgbtfobia³, os nossos QUATRO tiros a queima roupa ⁴ ou do esfaqueamento de jovens gays por aí sem chance de lacrar livremente ou de simplesmente dar as mãos aos seus parceiros em público.

NOTAS

¹ Não percam o tempo de vocês comigo, coloque sua energia em algo produtivo, mesmo que num post de rede social como fizeram pro Marcelo Macêdo à exaustão. 

² Ache toda forma de amor válida, como eu também acho. Só que não adianta só achar legal e viver postando frase de Instagram à espera do amor da sua vida pra ser fiel, monogâmico e casar na praia ou no campo com a benção de uma “igreja inclusiva”.

³ Nada contra Jéssica Senra, antes que interpretem do jeito errado.

⁴ Não adianta ficar chocado com gay alvejado de bala ou esfaqueado, se passa pano pra todo tipo de expressão – do artista, do amiguinho, no grupo do ‘zap’ – que reforça preconceitos e segregação.